Foi justamente por questionar se sair da caverna para abraçar aquele tigre dentes-de-sabre fofinho era de fato uma boa ideia que nós estamos aqui hoje.
Mas não gosto quando a desconfiança se torna excessiva e não vem acompanhada de um mínimo de embasamento científico.
Por exemplo, o que acontecia com o Nick.
No primeiro ano de vida, ele foi alimentado com leite materno.
Era muito simples detectar os momentos em que ele achava ser adequado que a Carla desse de mamar: ele URRAVA DESCONTROLADAMENTE com os olhos jorrando lágrimas até que fosse atendido.
E toda manhã era assim. Era só ele acordar que lá viam os berros inconsoláveis de fome. Não havia nada que a Carla pudesse falar no curto trajeto entre nossa cama e o berço dele que aplacasse sua ira pela indesculpável demora no atendimento da garçonete-mãe.
Com o tempo, a mamadeira substituiu o peito e a locomoção bípede substituiu a incapacidade de se mexer que o prendia ao berço. Mas os gritos enfurecidos perduravam.
Toda manhã, durante 2 ANOS E MEIO, o ritual se mantinha: o Nick acordava e percebia subitamente que não havia o “tetê” dele NA SUA BOCA, justificando com isso uma explosão de gritos e choro compulsivo, provavelmente passando a todos nossos vizinhos a impressão de que nós o acordávamos com ferro em brasa.
Um dia, minha paciência se esgotou com a falta de tolerância dele (perceberam a ironia da frase?)
Ele veio se arrastando aos urros de “TETÊ! TETÊ! TETÊ!” até nosso quarto, e eu o peguei pelos braços, olhei profundamente nos olhos dele e falei, num tom duro e autoritário:
“Nick! Nos últimos NOVECENTOS E DOZE DIAS da sua vida, todos os dias – TODOS os dias – sempre demos o seu leite quando você acordava! Então POR QUE você está chorando? Me explica! Me dá UM ÚNICO MOTIVO para você chegar à conclusão de que JUSTAMENTE HOJE, a gente iria DEIXAR VOCÊ PASSANDO FOME?! HEIN?!”
Ele parou de chorar na hora, me fitando com olhos arregalados e a boca aberta.
Neste breve momento, percebi que o choro havia parado porque ele finalmente havia entendido que essas duas pessoas que estavam ao seu lado não eram apenas pessoas – eram seus PAIS.
Havia percebido que nós nunca permitiríamos que ele passasse por qualquer necessidade, o que tornava qualquer demonstração de desespero matinal em algo fútil, desnecessário.
Ele estava amparado. Protegido por duas pessoas que o amavam, e o amariam sempre, acima de tudo e de todos.
Seus olhos, ainda encharcados pelas lágrimas, tornaram esta conexão entre pai e filho em um momento ainda mais especial, e meu peito se encheu de orgulho e emoção.
Mas é claro que ele foi se esvaziando rapidamente à medida que o Nick, recuperado do susto da bronca, voltava aos seus estridentes e ensurdecedores gritos de “TETÊ! TETÊ TETÊ!”