segunda-feira, 30 de agosto de 2010

INOCENTE ATÉ QUE SE PROVE O CONTRÁRIO. OU NÃO.

Pegando carona neste post anterior, lembrei de um episódio interessante relacionado ao tema.

Passando pela sala, detectamos um hominho desenhado na parede. O desenho tinha o estilo característico do Tony e na hora o chamamos para prestar seu depoimento.

Perguntamos quem tinha feito o desenho e ele parou, colocou a mão no queixo e contemplou os rabiscos tal qual um paleontólogo se deparando com hieróglifos numa pirâmide. Segue o diálogo com a Carla:

“Hmmm... tô achando que foi o Nick...”
“Ah é? Então eu acho que vou ter que colocar o Nick de castigo, né?”
“Isso, mamãe. Põe ele de castigo.”
“Tony! Você sabe que foi você e não o Nick que fez este desenho, né?”
“(suspiro) Sim...”
“Então você ia deixar ele ficar de castigo por algo que você fez?”

Nisso o Tony se aproximou, abraçou a Carla carinhosamente e disse: “Desculpa, mamãe...”

A atitude emocionalmente chantagista pode não ter isentado o Tony do castigo, mas com certeza fez com que a Carla se sentisse muito mais culpada por deixá-lo CINCO MINUTOS pensando sobre o assunto no quarto.

O fato é que ele aprendeu que, mesmo tendo errado, há benefícios em abrir o jogo e demonstrar arrependimento.

O melhor exemplo disso foi quando apareceram uns desenhos na mesa da sala (não em papéis sobre a mesa, mas NA mesa). Ao serem confrontados com os rabiscos, ambos negaram veementemente e a Carla disse que, se ninguém assumisse a autoria do crime, ela iria deduzir que ambos fossem culpados. Mesmo assim, ninguém admitiu.

Aí, em determinado momento, ela foi para a cozinha e eu tentei uma última cartada, falando quase como cúmplice dos dois.

“Vocês sabem que ninguém apanha nesta casa, né? A gente só quer saber a verdade, só quer que a pessoa que fez isso diga quem foi. Poxa... a gente quer que vocês tenham a porta aberta para falar com a gente mesmo quando as coisas ficam complicadas, e a única forma de fazermos isso é com vocês confiando na gente e a gente confiando em vocês...”

Fiquei nesse bla bla bla ético durante alguns minutos enquanto ambos me observavam com atenção, analisando meu papel de conciliador nessa história toda. E aí um deles se manifestou.

“Então... fui eu...”

Fiquei feliz e na hora quis demonstrar que o que eu havia falado era a verdade. Ele não seria punido, mas expliquei que o que ele havia feito era errado e pedi para ele nunca mais fazer isso, etc.

Ele balançou a cabeça humildemente, prometeu não fazer mais isso e os dois foram dispensados da mesa para brincar no quarto.

Fui para a cozinha e relatei o ocorrido à Carla, que sorriu levemente e disse:

“Quem você falou que assumiu a culpa?”
“O Tony.”
“ Você viu os desenhos?”
“Sim. O que que tem?”
“São do Nick. Pode comparar com qualquer desenho dele.”

Ou seja, o Nick fez os desenhos e o Tony, ao perceber que ganharia pontos por assumir a culpa (e ao ter certeza de que ninguém seria punido por isso), decidiu "confessar" e sair como o grande herói da história. Praticamente um Tiradentes.

O fato do Nick ter PERMITIDO que o Tony fizesse isso é algo digno de estudo, mas o que me intriga de verdade é o seguinte: como é que alguém consegue utilizar duas maneiras completamente antagônicas para lidar com uma mesma situação - "Foi o Nick" e "Fui eu" - e mesmo assim sai de ambos os casos como um BAITA DUM MALANDRO SAFADO?

6 comentários:

  1. Porque ele é inteligente e vai falar o que precisar para ser liberado. A parte de ser ético não é inata, acho. A gente nasce para ser esperto e não ético. Depois é que a civilidade vai sendo incutida. E não estou certa de que seja uma boa coisa... em um mundo cheio de homens da caverna vale a pena não abafar todos os instintos anti-éticos deles, acho.

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  2. Definitivamente! Quando digo malandro safado, é no bom sentido. hahahaahahahaah

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  3. er..discordo da Marta..eu nasci ético e (provavelmente) morrerei ético. :)

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  4. Isso me fez lembrar de uma historia da minha infancia em que eu botei a culpa em mim de algo que nao fiz para poder acabar com discussao logo, me sair de heroina e voltar a brincar. A diferenca e que eu acabei apanhando da minha mae - e meus irmaos nao assumiram a culpa ate HOJE!!!

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  5. Ah! Nada como uma boa surra para marcar os momentos da infância!

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